quarta-feira, 14 de setembro de 2016

O fim das coisas.


É estranho quando a gente descobre que as coisas acabam. Quando somos crianças, quase tudo existe desde que a gente nasceu e sempre surgem coisas novas, dando aquela sensação de que as coisas são infinitas e sempre haverão mais coisas. Lembro a primeira vez que eu descobri que algo acabava. Todos os dias depois da aula eu assistia TV Cruj. Era apaixonado pelo mundo onde aquelas crianças eram capazes de invadir um sinal de tv do porão de casa e criar sua própria programação. Talvez até foi aí que me veio a vontade de trabalhar com comunicação e criar conteúdo pra que as pessoas assistissem. Enfim, eu assistia todos os desenhos, me vestia como eles, falava como eles. Eram o role model que meu eu pré-adolescente achou em meio a tanta bagunça na cabeça de uma criança. Entre eles, um gordinho meio desengonçado, com humor pontual e que estava ali não pra chamar atenção, mas pra mediar e fazer as coisas acontecerem enquanto seus amigos brilhavam. Cara, como eu era fã do Macaco! Ele era o símbolo que mesmo fora dos padrões e confuso pra caralho sobre minha personalidade, eu poderia ser admirado por alguém como eu o admirava. E foi dele mesmo o baque. Não me lembro exatamente como foi, em uma época pré-internet a gente não ficava sabendo dessas coisas antes. Mas em uma tarde qualquer, ele anunciou sua saída. Aquilo acabou comigo e inclusive acho que foi o primeiro passo de um desânimo que fui pegando pela tv nos anos seguintes. Eu chorava demais, não entendia porque que o meu personagem preferido tinha que sair. Lembro demais do meu pai me abraçando e me explicando que às vezes, quando a gente cresce, a gente precisa deixar algumas coisas pra trás. Engraçado, justo meu pai, que nunca foi de conselhos e frases de efeito, falou uma das coisas que mais me marcaram na vida. Levo isso comigo desde então. Lembro de alguns anos depois, chegar um dia da escola e separar todos meus brinquedos para que fossem doados. Sem traumas, sem sugestão. Lembro quando mudei do apartamento que cresci e fiquei responsável por organizar e acompanhar toda a mudança que meus pais não poderiam fazer. Todos diziam que eu estranharia demais as primeiras noites, mas nunca dormi tão bem. Durante minha adolescência vi minhas bandas preferidas acabarem no auge da minha comoção, vi amores platônicos virarem as costas para mim sem motivo algum, fui abandonado literal e metaforicamente por inúmeras coisas que eu amava. E foi isso que eu eu entendi da vida adulta: as coisas vão embora e você não tem poder sobre elas. Com o tempo a gente aprende a lidar, ou pelo menos sobreviver. Aprender que mesmo que parte do que te faz você vá embora, as marcas e as memórias vão ficar lá pra sempre. E com isso a gente entende a perda e se culpa menos quando somos a perda de alguém. A vida, sua e dos outros, continua, com ou sem você.

Um comentário:

  1. Que história interessante essa da TV Cruj. Eu lembro que sofri absurdamente na minha infância quando acabou um anime que eu gostava demais. Lembro de chorar soluçando porque eu tinha me dado conta de que "eles vão parar de passar a partir de agora e eu NUNCA mais na minha vida vou poder ver de novo". hahaha
    Meu eu da infância não contava com a internet ou a facilidade que hoje em dia temos acesso a essas coisas, mas foi um sentimento inocente e sincero à época.
    De qualquer forma, é bem isso o que você disse mesmo. Por mais triste que seja, por mais que doa por dentro, a vida continua.

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