quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Nas nuvens.

Eu moraria nas nuvens se eu pudesse voar
Sentado sob o Sol e acima do mundo
De camarote observando o luar
Bater de asas acalentando ao fundo

Às vezes entraria nas nuvens pra me isolar
Me cobrir de branquidão e sentir a estática
Fazer de travesseiro a umidade do ar
e manipular na mente a mudança climática

Causar chuvas num movimento brusco
Num pesadelo que só se tem no céu
Caindo eternamente em um sonho fosco
Acordar assustado em uma cama de hotel

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

O pico.

A grande verdade é que eu odiei esse ano. Todas as retrospectivas, os convites para lembrar o que de bom aconteceu em 2017 me faziam chorar imediatamente. Não consigo. Termino esse ano com um gosto gigante de fracasso na boca. Da promessa inspirada em Belchior que fiz, dizendo que esse ano eu não morreria, e agora estou aqui a sete palmos do chão escrevendo essas palavras. O estado de piloto automático que entrei nos últimos meses convive com o constante alerta de perigo. Aceitei que perdi o controle mas morro de medo de onde isso tudo pode me levar. E eu acreditei demais, talvez por isso que doeu (e ainda dói) tanto. Acreditei que esse ano seria melhor, mais calmo, com mais resultados e finalmente abrindo caminho pra grandes mudanças. Mas o destino não está aqui pra satisfazer ninguém. Ele simplesmente acontece. Frustração talvez seja o nome dessa sessão que se encerra no próximo dia 31. Frustração de ver um futuro brilhante e naturalmente lógico simplesmente escorrer das mãos. Mas a expectativa só gera decepção mesmo. É como se o pico só existisse para contrastar com a queda que se segue. E não é que decepcionei alguém, eu decepcionei a mim. Por não ser forte o suficiente, por não achar soluções, por aceitar e não agir na hora certa. Não entender que estava errado. Não enxergar como melhorar. Por não ter as respostas que as pessoas esperavam de mim. Eu falhei com tanta gente. Deixei tanta gente triste. Mas eu perdi a força e a vontade de fazer as coisas que me motivavam. Que me orgulhavam. Porque o sentimento é que é sempre em vão. Não tem louros, não tem reconhecimento, não tem impacto positivo nos outros. Minha cabeça, cada vez mais bagunçada. Tentar me entender, procurar ajuda, já é um grande passo. Mas é difícil demais. Eu vejo as pessoas de formas planas e binárias. Eu mesmo estou na quarta dimensão. Quanto mais eu me encaro, mais desesperado fico de não me entender. Geografia lovecraftiana. Eu me sinto sozinho mas sei que preciso conviver com isso. Eu me sinto carente mas sei que não é no outro que tenho que encontrar isso. Eu sei tudo o que eu não posso fazer, mas não consigo encontrar em lugar nenhum o que diabos eu devo fazer. Qual é o próximo passo? O que as pessoas fazem para se sentir bem? "O que Jesus fez enquanto esteve morto, porque meu problema tá durando mais do que um fim de semana? E vamos combinar um sinal então se não tiver mais solução, porque assim eu sei que é você é que acabou, então eu nem vou tentar." É impossível acreditar em qualquer coisa na decisão a situação. Karma é a pior delas. "Coisas boas acontecem com pessoas boas". Só posso afirmar que coisas acontecem com pessoas. Não existe justiça divina ou dos homens. É só a aleatoriedade das relações sociais, todo mundo jogando seus próprios dados. E você machuca alguém, mesmo com a melhor das intenções, aí você se isola e se machuca. A felicidade é só um instante entre a última vez que alguém se machucou e a próxima. E eu não aguento mais carregar a culpa que eu mesmo me coloquei. Não aguento mais machucar as pessoas. Mas eu sei que sozinho não consigo nada. Mal consigo passar a noite. São as contradições que tentam achar seu espaço na minha cabeça, sendo atacadas e punidas pela minha própria mente. Isso não é aceitável. Mas nada é meu por direito. Ninguém deve obrigação a mim. Cada um está buscando sua própria plenitude da maneira que acredita ser justa. Eu sou só uma frase, um parágrafo apenas. Quando muito um capítulo na vida das pessoas. Muitas vezes nada memorável. Me convenci da minha própria grandeza muito cedo, acreditei que era capaz de coisas relevantes. Mas esqueci da perspectiva e do outro. Pra alguns eu não sou nada, pra outros eu só sou um qualquer. Eu acreditei que era indispensável para alguns e só tomei no cu. Indispensável só si mesmo. Todo o resto é descartável, retornável, substituível. Eu só queria um propósito, algo que pareça minimamente que vai dar certo. Estar a deriva não tem sido melhor do que estar naufragado na praia. Eu só quero que esse ano acabe logo pra que, dentro desse ritual bobo de passagem de data, minha cabeça se dê a oportunidade de começar de novo. De fazer minhas coisas, de querer algo novamente e de não me sentir tão abandonado e sem propósito. Não aguento mais. Eu só quero acordar desse pesadelo.

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Não é planeta.

As expedições chegaram mais longe do que imaginávamos, mas ainda faltava muito. A viagem, longa como todas as outras, variava entre a monotonia e momentos de extremo cuidado. Mas era essa a missão em que a equipe se inscreveu. Anos de treinamento para chegar cada vez mais longe. Com os planetas mais próximos já colonizados, aos poucos a humanidade alcançava novas regiões do universo em busca de recursos. O esgotamento da Terra foi natural e a evolução da tecnologia não avançou na medida que acreditávamos. A essa altura, já teríamos nos estabelecido em outro sistema. Mas a capacidade energética necessária para se mover de um ponto a outro do universo mostrou-se um desafio.
Os primeiros passos foram mais tranquilos e fáceis de estabelecer, mas as condições ainda estavam distante das ideais. Alcançar esse novo (e talvez último) ponto do sistema era crucial para seguir para a nova terra. A Terra Prometida, como os antigos religiosos acreditavam e convencionou-se chamar, primeiro por escárnio dos não-crentes, depois por necessidade em se apoiar em algo. E os tripulantes responsáveis por explorar essa nova região já sabiam que era um ponto sem retorno. Se não pelas dificuldades seria pelo tempo necessário de um ponto a outro. Uma viagem sem volta, como outros antes deles enfrentaram e sobreviveram. Como outros não tiveram a mesma sorte. Mas com o sentimento de seguir em frente, sempre. É o que cada um precisa, é o que a sociedade precisa.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Labirinto.

Existe uma técnica para sair de labirintos, infelizmente não existe uma pra entender o que eu sinto. A mão direita acompanha a parede do início até o final, indicando a entrada e a saída. O caminho é maior mas é seguro. Já minha mão direita só segura o peito com força como se minha dor autoinflingida fosse superar a dor interna. É como se eu soubesse o caminho mas o conhecimento não fosse exatamente a resposta certa. O instinto vai me levar para a saída, talvez não a saída que eu esperava, mas para fora. Mas como acessá-lo? Acostumado a ter o mapa na mão, é díficil demais continuar. Mas existe uma técnica, que deixa o caminho maior e mais seguro. Observo os outros e parece fácil, eles se perdem, encontram becos e voltam até achar outro caminho. Eventualmente a saída aparece. A naturalidade que se perdem e continuam me espanta. Como virar a próxima curva sem tentar entender o que vem depois?  Mas existe uma técnica. Existe uma técnica para sair do labirinto.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Cicatrizes.

Existe um certo charme no imperfeito
Na cicatriz, no desequilíbrio do defeito
O grão da foto, o leve desfoque
O sorriso torto, o abraço que
não encaixa direito.

Traz conforto ver no outro
Tudo que me culpa ver em mim

Sintomas escondidos sob a luz do camarim
Máscara que se usa todo dia no trabalho
Mas que no quarto abre guarda
Guarda sua insegurança, dança do meu lado
O frágil em você é o que precisa ser conservado.

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Nas montanhas.

Entro como quem entra em um lugar não-reconhecível. Longe de apenas desconhecido, um lugar onde a geometria não segue as regras padrões. Ângulos impossíveis e caminhos improváveis. Assustado com o que meus olhos desentendem, ando sem rumo em busca de uma porta, ponte ou qualquer coisa que simplesmente faça sentido. A solidão ecoa de formas pouco prováveis e o silêncio se mostra mais presente do que nunca. A presença da ausência incomoda, a contradição se manifesta de forma física e dói. Cada passo pede um esforço muito maior do que o previsto, como se a gravidade trabalhasse contra em todas as direções. Nem a textura das paredes meus dedos reconhecem, como se tudo fosse ligeiramente diferente de propósito. A luz bate como na borracha mas o toque sente o aço frio. O corpo pesa mas a necessidade de resposta luta contra. A caminhada continua enquanto a montanha segue. Sem saída, continuo em busca de um mísero sinal de sanidade fora ou dentro de mim.

quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Ressaca.

Entre a cortina, um raio de sol ilumina parte do seu rosto.
O gosto da ressaca, a cabeça dói, a mente fraca.
A água falta, desidrata.
A noite passada se esconde em mistério.
O critério, cada vez menor, reflete em arrependimentos.
O pensamento a mil, confuso, febril.
O corpo retorce, abraço e aceito.
Porque o que foi feito acaba tendo pouco efeito num panorama geral.
E se o corpo passa mal, que sirva de aprendizado
De que o passado volta pra assombrar no dia seguinte
Mas outros dias seguem.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Última balada.

Numa tarde de domingo de um dia nublado,
seu sorriso e risada preenchiam meu quarto.
No meu violão uma balada triste
que você acompanhava num rima livre.
As roupas jogadas como quem não tem pressa.
a fotografia pegava o detalhe.

Numa noite de domingo de um dia chuvoso,
seu sorriso nervoso dizia o que eu não queria ouvir.
A meia-luz destacava a meia-lua no chão,
a lua cheia iluminava o colchão.
"Uma última balada?", eu pedi,
mas perdi, você já tinha ido.

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Deriva.

O vazio é o que mais incomoda. O buraco na rotina. Um membro-fantasma que dói só para chamar atenção para sua ausência. A dependência física e psicológica é um quebra-cabeça incompleto que você precisa aceitar que está faltando peças. Estão perdidas debaixo de tapetes ou dentro do sofá. A conversa casual que fazia o ponteiro rodar não pode ser substituída porque nenhuma outra conversa é casual. Tudo tem objetivos e motivações. E o tempo é o que não passa, porque só ele mesmo que tem que passar. Livros, filmes, séries, festas, trabalhos, amigos, jogos. Tudo em câmera lenta como se me puxasse para fora do palco e dissesse "você não está pronto". E nunca vou estar, a gente só se acostuma e toma coragem pra continuar apesar dos medos, apesar do despreparo, apesar do vazio. É o castelos de cartas que desmorona quase no fim. Não só desmorona, pega fogo e de repente não há mais cartas. O fogo queima sua mão. Você respira fundo e pensa se quer mesmo recomeçar. Você viu seu objetivo tão próximo e já não sabe se compensa passar por tudo de novo para chegar em um lugar que não era aonde você queria. Tem dia que bate mais pesado mesmo. O silêncio fala mais alto que o fone de ouvido. O eco reverbera as palavras não ditas, os fatos não feitos. Como dói. A lágrima cai fácil e inesperada, tudo é gatilho. Um tiro doeria menos. O consolo é saber que sobreviveu até aqui, de momentos piores, tudo isso vai passar. Não hoje, nem amanhã, mas vai. O vazio se preenche com outras coisas, a ausência de torna menos presente e menos notada. Enquanto isso o barco flutua a deriva, torcendo pra que o vento não bata nem que nada o afunde. O sol queima e o sal desidrata. Mas a terra chega pra todo náufrago.

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Relatividade.

Não sei quando foi
que o tempo começou a passar diferente,
mas sei que de repente
as horas não eram mais as mesmas.
E mesmo que eu ocupe a cabeça,
peça aos céus que algo aconteça,
a hora está mais devagar.
Divago sobre o motivo,
sobrevivo cada minuto,
mas a hora seguinte demora a chegar.
No meu peito, mora a angústica,
a perspectiva vive perdida,
porque a dor mais doída
é a espera de algo que não vai voltar.
Preencho as lacunas com linhas e colunas,
tentando ocupar o tempo que sobra.
Mas as sobras, migalhas de um outro momento,
ganham a atenção
como um ponto preto em uma superfícia branca.
A gota de sangue estancada segura a sangria a cada dia.
E quando os olhos fecham finalmente
em pesadelos consecutivos,
É breve o descanso pela frente
É longo o tempo de mais um dia.

terça-feira, 3 de outubro de 2017

Nostalgia.

Eu julgava a nostalgia uma ferramenta fácil para atender uma geração que não se acostumou a ter seus brinquedos tirados de si. Estampamos nossos gostos infantilizados em camisetas e prateleiras, e somos convencidos por qualquer coisa que tenha um gostinho de infância. O remake ou uma continuação de um filme que gostávamos, um produto que traz de volta a embalagem dos anos 90. A nostalgia como argumento de vendas sempre existiu e quando você trabalha com publicitário, algumas cordas do sistema parecem visíveis demais.
Crescendo na cidade, nunca entendi muito bem aquele carinho que as pessoas tem pelo interior do país e as comidas da roça e mesmo os melhores aspectos da minha infância eram muito bem quistos como memória mas não entendidos como saudades ou vontade de voltar para uma época X ou Y.
Mas foi recentemente que a Nostalgia ganhou um aspecto diferente da minha vida, me mostrou lados que eu não conhecia e que me fez entender melhor o sentimento geral das pessoas. Foi quando, em crise, um instinto me fez procurar um lugar seguro e me transportou para a infância. Por uns minutos novamente eu tinha 6/7 anos. Sem nenhuma preocupação a não ser conseguir dormir, e foi o que eu fiz. Horas acordado em pesadelo lúcido resolvidos nos primeiros acordes de uma canção de ninar ou conto de fadas.
Sem ter consciência do teletransporte temporal que minha mente é capaz, ativei sem querer e entendi novamente esse meu super poder. A crise era outra, o momento era difícil e, por outros motivos, revi uma história que gostava muito há uns anos atrás. De repente, era eu novamente com vinte e poucos anos, sem as preocupações e problemas atuais, revivendo um breve momento de tranquilidade. Aquilo me sugou da neblina que vem cobrindo meus dias e me mostrou uma saída. Ainda que distante, é importante saber que ela existe.
A nostalgia então, mais que um mero capricho de pessoas que insistem em não envelhecer, ela é um lugar de conforto. Um porto seguro em um mundo desconhecido e cada vez mais perigoso. As mudanças não se mostraram boas até aqui, então encontrar um rosto conhecido nas telas, prateleiras e vestuário nos leva, mesmo que inconscientemente, para um momento onde as coisas eram mais simples.
Claro que o passado também tem suas armadilhas e os momentos felizes chegam como socos no estômago de quem não poderá repetí-los, mas se apegar ao que te fez bem é um começo para quem está buscando novas memórias para o futuro.

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Inspiração.

Seu corpo é poesia
obra prima de um
mestre renascentista
inspirado pelo
mais belo dia
na tela e tinta a óleo
Olho pra você
e me emociono
como em um sonho
que no outro dia
não vou esquecer
é você que me tira o sono
abandono o dia
pra dormir com você
puxa o cobertor
como que sente frio
mas o arrepio
mesmo vem da nuca
sua respiração profunda
batimento cardíaco
calma, que sou cardíaco
meu coração não guenta
arrebenta
pulsando sangue pelo corpo
torpe torto vivo ou morto
motivo pra viver.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Trança.

A coluna arqueada revela
Mais sobre mim do que sobre ela
A unha na pele marcada
Cicatriz da noite passada
Perco o fôlego e a voz
Deixei de ser eu, passei a ser nós
Meu corpo pulsa, o seu treme
A vida navega, eu sou seu leme
Tormenta e calmaria em quinze minutos
O tempo para quando estamos juntos
O coração à deriva encontra o porto
Mar morto revive, flutua em conforto
Ofegante abraço finaliza a dança
Rosto colado, pernas em trança
Um último suspiro confirma o fim
Foi bom pra você? Foi lindo pra mim.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

Mil graus.

O suor no corpo não disfarça
A cabeça quente embaraça
A decisão de quem diz que não.
E entre berros e apontamentos
Dedos deslizam sobre o copo
Vapor como em gelo seco
De um whisky que nunca foi cowboy
E se a gravata afrouxa no calor do momento
A ciência nega em descontento
Olham-se em desespero
Ricos rindo do futuro, sem medo.
A ignorância derrete a esperança,
As crianças brincam com o tempo
Pouco tempo que ainda resta.

Galo velho, sofredor.

Do alto da cerca o galo canta
Com a pouca força que o resta
No resto do dia ele descansa
Vivendo a vida de quem não tem pressa

O galo manca velho e fraco
Crente que não dá mais conta
Mas se outro galo canta no pedaço
Um estardalhaço ele apronta

E pra quem espera sua morte
Ansioso por uma bela canja
Sinto mas não está com sorte

Porque quando o dia nasce ele levanta
Iliuminado pela luz laranja
E de novo, do alto da cerca, ele canta.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

O bobo não leva a culpa.

O lobo em pele de cordeiro
Passava tanto tempo camuflado
Que quando questionado
Se era carneiro ou se era lobo
Se fazia de bobo ou se confundia.
É que repetindo para si todo dia
Na hora de deitar no travesseiro
Com o tempo ele foi esquecendo
Se era lobo ou se era carneiro

Mas a mãe natureza é mais forte
E se por azar ou por sorte
Um colega se feria
E o cheiro de carne invadia suas narinas,
O ataque era brutal. 

Mas logo em seguida limpava sua lã
E se questionado por suas irmãs
A consciência nem pesava
Pois como alguém culpava
Um frágil cordeiro, pobre animal.

quinta-feira, 8 de junho de 2017

Um novo dia.

Se todo sonho
envolver perdas e ganhos
Qual o tamanho
do esforço que você
está disposto a assumir?
Rir de si mesmo
deixa a vida mais leve
mesmo que isso leve
Um tempo longo pra aprender.
As cicatrizes dóem
Como memórias que corróem
Sua mente mesmo que tente
esquecer.
E a felicidade é passageira,
pequenos momentos
de uma vida inteira.
Sentimentos de poder.
Poder chegar mais longe,
Sol que nenhum horizonte
Teve a honra de conhecer.
E se todo dia mais inerte
Você se perde na rotina,
O trabalho é a guilhotina
O dinheiro o carrasco.
O frasco vazio no criado mudo
O vento frio de assobio agudo
E a garantia que no final de tudo
Um novo dia vai nascer.

quarta-feira, 31 de maio de 2017

Conversas vazias.

Conversas repetidas, vazias sem nexo
Disfarçam o complexo medo de estar só
E se a distração do momento vale ouro
É triste ver todo esse tesouro virar pó
O eco na cabeça das palavras ditas
Automaticamente respondidas no impulso
Tiram a atenção da apatia e falta de pulso
Da indiferença de estar ali.

Mas em algum momento o corpo cede,
A mente pede por mais consistência
E se até a consciência pede ajuda,
Quem é que escuta o chamado final?

Se isola no silêncio, num quarto imenso de vazio
E se sozinho sente frio, esquenta o peito,
Dá-se um jeito de sobreviver.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Vizinhos.

A mão desliza sobre a blusa
Usa-me, ela diz, lê-se na sua boca
Peças caem sobre o chão
Corpos caem no colchão
O controle aumenta o som
pra disfarçar a movimentação
Os vizinhos não merecem
Mas invejam de saber
Cada rangido da cama
Cada grito de prazer
Lá em cima, dissociam
Se saciam entre medos
Língua, pele, toque, dedo 
Tocam-se em perfeita harmonia
A sinfonia em dueto
Toma o cômodo como um todo
E os dois se unem em contração
Ambos corpos em ação

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Transtorno.

O tique do relógio dita o passo do caminho
A linha na calçada guia o TOC direitinho
A tranca destrancada vai e volta por certeza
Limpando novamente sem deixar marcas na mesa
Os quadros alinhados mostram a bela paisagem
Levando seus próprios lençóis em cada viagem
E se o ritmo da vida é planejado em preocupação
Incerto apenas é o ritmo da batida do coração.

quinta-feira, 13 de abril de 2017

Dissociação.

Dissocio do meu corpo após mais um copo
Os óculos sujos disfarçam o vermelho dos olhos
A dor espiritual e física espera tal hora, cínica, 
pra se manifestar
O passo pesado dita o ritmo do translado
Do trabalho para o lar
Onde um banho quente espanta de repente
Os males a me incomodar.
Na cabeceira da cama minha cabeça descansa
Como quem amansa uma fera faminta
E se não era, sinta como se fosse
O fundo do fosso nos trouxe
Um outro jeito de murchar.

quarta-feira, 5 de abril de 2017

Atrás do morro distante.

Atrás do morro distante
Mora um velho viajante
Que caminha pelos campos
Com olhar baixo e passo manco

Em sua bolsa leva tudo
Sua espada e seu escudo
Em busca de uma loucura
Que justifique uma aventura

Um ouro escondido
Uma princesa em perigo
Que vire sua amante
Atrás do morro distante

E é atrás do mesmo morro
Que a noite ouve-se o choro
Do viajante, bem baixinho
Triste por estar sozinho

Nem relincha seu cavalo
Que insiste em acompanhá-lo
Se esquentando ao seu lado
Pelas viagens do passado

O viajante pobre coitado
Ainda espera a motivação
Está sempre preparado
Pra pegar a próxima missão

Mas enquanto ela não chama
Faz-se do mato sua cama
Esperando doravante
Atrás do morro distante

quarta-feira, 29 de março de 2017

Viagem no tempo.

Qual foi a música, sabor ou cheiro
Que me levou através do tempo
para o dia que conheci você?

E estando aqui agora, 
me diz ainda se demora
Pro nosso beijo acontecer.

A mão suada me entrega,
Seu nervosismo não nega.
Aconteceu o que era pra ser.

E se hoje eu vejo 
Com carinho aquele beijo
Sei que deixo muito mais do que uma boa impressão

Porque o tempo muda tudo
Trabalho, viagens, estudo
Mas não apaga o que marcou pra sempre o coração.

segunda-feira, 27 de março de 2017

Leve atraso.

Você você indo embora me fez faltar o ar,
Grito mas você ignora o que eu quero falar
O tempo passa como um relógio de engrenagens ruins
Esquecendo que o tempo corre contra mim
E quando o tempo passa e você não vê
O ponteiro atrasa e passa sobre você
Pesando os anos nas costas de quem não espera
A hora de largar as armas e sair da guerra.
Escuto o eco dentro de mim de não ser alguém,
A cobrança de chegar em um lugar e de ir além
O que o futuro me reserva não quero saber

Deixo que o tempo, na hora certa, mostre o que vai ser.

quarta-feira, 22 de março de 2017

Caleidoscópio 3.

Piso com cuidado no espelho quebrado sobre o chão.
Vejo, perplexo, o reflexo do sangue pingando das minhas mãos.
O sol do fim da tarde invade 
e ilumina de baixo pra cima o copo no balcão.
Meu cérebro em ópio não enxerga ao certo a imagem formada em pedaços.
Como em caleidoscópio, visto bem de perto, um rosto rabiscado por traços.
Tento em vão limpar o chão manchado de mim.
Mas o pano vermelho só espalha o espelho adiando seu fim.
A parede marcada denuncia o descuido,
coagulado o fluido, posso ir embora enfim.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Luta.


Cada um é o herói da própria história. Cada um sabe os seus motivos e justificativas que relativizam a dor causada no outro. Somos sempre a vítima, o sobrevivente contra tudo e contra todos. Um complô do mundo para nos fazer mal. Mocinhos e bandidos dividindo os mesmos gatilhos. Não muda nem a roupa, muda só o ponto de vista. Na régua para medir quem causou o menor mal, a dor de cada um é imensurável. Não há fita métrica para comparar os sacrifícios de um lado que gerou o sofrimento do outro. Na nossa cabeça, estamos sendo prejudicados pelo destino, quando na verdade a vida segue. A gente cai é pra levantar mesmo, o segredo é o cuidado de não derrubar ninguém no caminho. O cuidado de ser sincero com os outros e com você mesmo. De entender seus próprios sentimentos e saber a hora certa de colocá-los como prioridade. O mundo não gira em torno da gente, não conspira contra a gente. A folha cai, o rio corre e a gente… a gente é pequeno demais no todo. No tempo e no espaço. O planeta sobrevive sem a gente, mas a gente precisa um do outro. Então, vamos só ter cuidado, ser leal, ser humilde, ser honesto com nossos sentimentos. Não precisamos de vilões e planos mirabolantes. Somos só pessoas tentando fazer o melhor com a vida que a gente tem. As batalhas são inúmeras, todos os dias por todos os frontes. Que nossas lutas sejam justas.

sexta-feira, 10 de março de 2017

Para Michel.

Presidente,
A gente entende. 
É triste aí de cima
Não ter ninguém pra te ouvir.

Os seus amigos, decorativos
Ao menos riam pra te ver sorrir.

Mas agora, no salão vazio,
Um vento frio entra na janela
Deixada pela Marcela
Pro pequeno Michelzinho poder dormir.

A luz da vela ilumina mal
O poema rabiscado no jornal.
Não liga com medo de que ela atenda
Mas ela te ouvia, a presidenta.
Num neologismo incorreto,
queria você
ser o nosso poeto.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

Ghostin' Town.

Na minha cidade fantasma
Só a asma ataca
A poeira acumulada
Por anos de deixar pra trás
Esquecida, abandonada
Forjada em memória morta
Suas portas tortas não encaixam mais
As ruas frias seguem vazias e escuras
E, em vez da cura, o que se acha é dor
Do parapeito da janela, 
dói no peito a lembrança dela
Encostada esperando 
uma volta que não está nos planos
Pois no primeiro passo para fora,
No mero pensamento de ir embora,
A cidade já se esquecia do agora
E sumia junto com a aurora.

Na visita, invade a sala, 
Uma poltrona acabada
Como um livro em uma estante

Que não estava ali antes.