quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Pequenos monstros.

Conheceu ele na casa de um amigo em comum, entre taças de vinho, ele tentava inutilmente explicar um jogo de cartas para o grupo. Ninguém estava realmente interessado, mas ele continuava sua explicação com tanta paixão e dedicação que ganhou a atenção dela. Não o jogo, que era realmente chato, mas o jeito dele. Ele era simples, dessas pessoas que parecem menos do que realmente é. Mas ela o via além. Ela via nele um homem que não descansaria antes de vê-la feliz. Ela via alguém que talvez trouxesse café da manhã na cama, e com certeza lavava sua própria vasilha. Alguém que saberia o valor de ver um filme a dois e aconchegá-la em seus braços quando ela dormisse no meio do filme. Alguém que daria presentes de aniversário planejados com meses de antecedência, talvez até personalizados a mão. Alguém que ensinaria seus filhos a andar de bicicleta, jogar futebol de botão, respeitar os mais velhos e não brigar na rua. E aceitaria ela do jeito que ela é, com todos os pequenos monstros que habitam sua mente, suas manias, trejeitos e preconceitos e nunca, nunca, reclamaria dela cantando as músicas do Agnaldo Rayol do cd que ela ouvia quando criança. Recolheria as toalhas que ela deixa jogada e ensinaria ela a tocar violão. Caminharia três vezes por semana no parque, não para emagrecer, mas pra não morrer de ataque cardíaco aos 40 anos. Não admitiria que ela tivesse engordado, mesmo a calça claramente não entrando mais. Deixaria ela comprar o requeijão light e aquela geleia de abóbora que ela tanto gosta. E não seria um problema também se fugissem da confusão da cidade grande para morar na cidadezinha que ela cresceu, lugar ideal para criar os filhos e... E ele continuava falando sobre o tal jogo de cartas quando ela saiu pra pegar outra taça de vinho e se distrair com outra coisa.