quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Dor que coexiste.

A grande verdade é que eu não me sinto na Austrália. Tipo, a impressão que eu tenho estando aqui é como se eu estivesse em Belo Horizonte resolvendo uma inconveniência que fosse me segurar por um pouco mais de tempo mas em uma ou duas semanas eu estivesse de volta. Tipo, depois que passa um dia ou dois que eu enfrentei a maratona de aeroportos, o efeito não é diferente de passar 15 horas em um ônibus. O desconforto da língua também não difere muito da minha dificuldade inicial de interagir com desconhecidos normalmente. Mais uma vez como se isso tudo fosse só um rolê diferente, como já foi em SP ou em BH. Algo passageiro e pontual e que em breve eu estarei de volta às pessoas que eu amo. Eu não sei o que é viver diferente disso e, depois de um ano me perguntando se estava em negação durante o processo me pergunto de novo se ainda estou em negação do outro lado do mundo. As coisas estão caminhando bem, se resolvendo mais fácil e mais rápido do que eu imaginei. Ainda falta o emprego, ainda estou inseguro com dinheiro. Mas fora isso tá tudo bem. Meus amigos, mais uma vez, ainda sinto como se eu fosse voltar em algumas semanas. Não sinto que será um ano ou mais, não sinto que vou ter que fazer novos amigos pra não ficar sozinhos aqui. O que mais me derruba é a Larissa, que apesar de ter sido fundamental durante todo o processo da minha saída do país, consequentemente se tornou também meu maior ponto fraco. Pensar na distância dela, nos caminhos que vamos ter que tomar daqui pra frente, na mudança dela pra onde ela queria estar, na eventualidade de termos que seguir em frente sem um ao outro, na esperança de nós encontramos depois e isso tudo fazer sentido. Era isso que me fazia chorar em Goiânia e é isso que me faz chorar aqui. Porque é como se vc ganhasse na loteria, tivesse dinheiro ilimitado pra gastar, mas tivesse também um prazo final pra gastar esse dinheiro. E eu sempre comentei como esse prazo nos fez ter uma visão diferente do que é se relacionar. Nos ver ter carinho e empatia pelo processo do outro, respeito pelos limites, apoio e amor. A gente foi (é?) sortudo demais de ter vivido isso. Coisa que a gente nem ouvia falar ou sonhava, de repente se fez possível em um relacionamento onde os dois lados estavam dispostos a falar e escutar. E é isso que me derruba, como algo tão bom pode nos levar a caminhos separados? Como se, caso fôssemos piores namorados um ao outro, ainda estaríamos juntos. Com pequenas sabotagens e chantagens que fariam o outro ceder, mudar de ideia, abrir mão. Não foi o caso, a gente apoiou ao ponto de sangrar a própria carne e estarmos os dois feridos profundamente com a distância, mas no caminho que julgamos ser o melhor. Mas dói demais. Não ter uma briga, não ter um desentendimentos ou chateação pra nos apoiar na separação. Esse último mês foi perfeito de maneiras que eu nem achava ser possível. Ela ajudou a manter minha cabeça boa, ir nos lugares que eu tinha que ir, encontrar que eu tinha que encontrar. Mas era em casa que a gente chorava, sem conseguir consolar um ao outro. De novo e de novo. Sem ter uma palavra de apoio ou esperança que não reforçasse ainda mais a dor da separação. Eu posso estar vivendo aqui o passo mais importante da minha vida, ou estar num mundo fantasioso onde as coisas nem estão acontecendo. Mas esse pedaço ali que coexiste no cérebro e no coração sabe, e dói demais, e dói não do jeito que cura depois, mas do jeito que você acostuma com a dor lá, o tempo todo. Porque tem coisa que não tem como superar, você só convive com o sentimento pra sempre e chora quando tiver que chorar.