sábado, 13 de janeiro de 2024

Trens.

Era mais fácil falar sobre as viagens de trem quando elas não existiam. Na vida real, elas são feitas de horas de podcasts e textos na internet. Algumas vezes a paisagem te pega de surpresa, ou o timing perfeito de um por do sol sobre a ponte te alcança. Uma garota descansa sobre os ombros do seu parceiro, uma criança ri de celular de um de seus pais. O trabalhador aproveita o tempo para trocar as botas e um estudante fala por vídeo com seus amigos do outro lado do mundo. Eu penso sobre a vida de cada um deles e penso se eles pensam sobre minha vida também. O que eles vêem em mim que atiça suas curiosidades? Se é que veem algo em mim. Será se perguntam sobre onde estou indo ou porque pareço triste? Quais histórias eu vivi e o quais poemas se perderam nos meus cadernos? Muito mais do que nas pessoas que eu vejo no meu trajeto, eu penso também nas pessoas que eu não vejo. Aquelas que não chamam minha atenção o suficiente e saem do trabalho para suas casas sem serem notadas. Como uma árvore cai na floresta mas ninguém escuta. Às vezes eu me sinto como elas. Andando invisível em um planeta distante. E sempre quando me aproximo do abismo, em vez de escutar chamarem meu nome, escuto o anúncio que chegou minha estação.

Caleidoscópio 6.

Caminho no corredor de espelhos
Ignorando o vermelho dos meus pés 
Piso nos cacos que me atravessam
Tornando a travessia cada vez maior
Mas as cores no fim do túnel iluminam meu rosto
E o gosto de sangue me alimenta de raiva
A dor não alivia, o silêncio não acalma
A alma se cala como quem já foi embora
A hora não passa e meus passos pesam
Rezo pra chegar logo o caleidoscópio no fim.