sábado, 4 de dezembro de 2021

Precipício.

"A gente morre sozinho"
Eu escuto de longe
E a queda é mesmo solitária
O vento corta frio

E mais que o impacto
É o espaço que mata
A distância da minha mão
Eu sobrevivo mais uma vez
De nove dias eu caio dez
E nunca é bom

A gente aprende
A gente acostuma
O tempo cura
Cura a mente

A palavra pesa
Mas dizem que o demônio
Só sucumbe pelo nome
E eu abraço a dor
Ainda sem entender a fonte

Encarando o precipício
Como quem não quer cair
Mas há uma certa fascinação
Que te prende no vazio

sexta-feira, 26 de novembro de 2021

O livro.

Lhes dei um livro de despedida
Onde eu contava parte da minha vida
Mais especificamente a sua parte
A arte se mostra de formas estranhas

Minhas entranhas em poema métrico
Registro fosco de um olhar de encanto
Pai, filho, espírito santo
Olhando por cima em um salão simétrico

A ótica na forma de um passado recente
A mente viaja pra salões vazios
O riso e o choro com marcas recentes
A coberta quente em um canto frio

Eu busco memórias positivas
Sentado em frustrado presente
Encontra a história e reviva
Depois volte a olhar pra frente

Hoje eu olho distante pro livro
Como ponto final e partida
Não ressinto mais essa vida
Começo de novo o que vivo

Em poema
Ganhei a liberdade
De amar quem vocês
São de verdade

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Crisálida.

Foram duas ou três horas que eu não existi. Estava no meu quarto escuro absorvido por amenidades na internet e simplesmente não existi.
Não existi pro outro e pouco existi pra mim.
Me senti a lagarta dentro da crisálida
Onde sua forma se remonta.
Mesmo consciente eu não estava ali.
Meu corpo não era físico, minha presença não existia.
A árvore que cai sozinha na floresta
E não faz barulho.
Mas quem está lá pra notar?
Não era um bom lugar, esses momentos me assustam.
E chegam com frequência nos momentos mais banais.
Não nos momentos de solidão, mas no vácuo da presença.
Naquelas horas onde eu não devia estar mas estava.
Podia estender um braço, uma mensagem, uma ligação.
Mas me faltava forma física para realizar.
Até que desisti.
E ao ir dormir, meu maior receio era
Será se ainda vou existir quando alguém me alcançar amanhã?

terça-feira, 25 de maio de 2021

Túnel.

Ícaro voou perto demais do Sol
Mas quem pode julgar que ele caiu?
Antes de descobrir o anzol
O peixe não sabia o que o atraiu
Me sinto ali, perto demais do meu futuro
Mas quanto mais rápido eu corro
Mais perto eu fico do muro
Descer a ladeira é o risco de subir o morro
Mas quem não quer ver a vista do alto
Se todo mundo tivesse medo da queda
Ninguém mais tentaria o salto
E quando túnel parece não ter fim
A entrada já está longe demais
Desistir não é opção pra mim
Tarde demais para voltar atrás

terça-feira, 30 de março de 2021

O que foi você?

O que foi essa parte de mim
Que de um dia pro outro
Se fez um ser por si
E me fez me sentir um pouco mais eu?

O que foi você que corria sem me ouvir
Sem medo de cair ou de se machucar
E cada choro sofrido
Rasgava meu peito devagar?

O que foi você me olhando nervosa
Esperando sua hora de subir no palco
Tentando lembrar cada passo que a gente ensaiou em casa?

O que foi você de coração partido
Procurando no meu colo apoio silencioso
Sua comida preferida e um filme bobo
Até chegar a hora de dormir de novo?

E o que foi quando você foi embora?
Quando chegou a hora de me despedir
Porque seu lugar era lá fora e não dentro de mim

O que sobrou de mim se tudo que eu era
Existia por você, pra você, de você?
Quem eu sou agora se foi você que me fez
Do mesmo jeito que eu fiz você
E agora só sobrou eu?

Presa.

Preso em casa eu percebo
A marca da presa na minha pele
A pressa da cura de quem fere
Vestígio visível do meu medo
Escondo embaixo da cama
Amanhã me traz novos tentos
Me esquenta e protege do vento
Emula o carinho de quem ama
Detrás do muro eu mantenho
E tenho tudo que eu preciso
O básico pra me manter vivo
Motivo pra guardar o que tenho
E se eu declarar meu amor
Por favor não responda o chamado
Pois consigo colocar de lado
Mas não com a certeza de não se amado

quarta-feira, 17 de março de 2021

Molde.

As botas apertam como deveriam
Elas precisam de tempo para se moldar
Eu ignoro o incômodo e persevero
Talvez não seja minha vez de se adaptar
Um passo de cada vez, um metro mais perto
Qual é o jeito certo de se mudar?
Longe de mim dizer que estou correto
Mas se estiver errado sou eu mesmo que vou pagar
"Reto é o caminho do sucesso
Não tem erro, é só seguir, pode confiar"
Me perco em atalhos desertos
Na esperança de que me levem pro mesmo lugar
O não-caminho é uma escolha em si
Passar por onde ninguém quis passar
Mas a falta de um guia aperta
Quando não tem sinal algum pra continuar
Mas a cada passo a bota se molda
Dessa vez não sou eu que vou mudar
Que o mundo se mude em minha volta
Meu destino é onde quer que eu vá chegar